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Artigo de Opinião | Prejuízo sério, alteração substancial ou simples transtorno?

in Notícias Gerais
Creado: 04 Diciembre 2014

 

O artigo 194.º do Código do Trabalho aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, vem regular as condições em que se pode transferir um trabalhador do seu local de trabalho. Segundo esta norma, o empregador pode, de facto, transferir, temporária ou definitivamente, um trabalhador para outro local de trabalho, mas nas seguintes condições:

a) Se houver mudança ou extinção, total ou parcial, do estabelecimento onde o trabalhador presta serviço.

b) Outro motivo invocado pela empresa e desde que a transferência não implique prejuízo serio para o trabalhador.

Mas há alguns obstáculos para o empregador. Assim:

i) A transferência temporária não pode exceder seis meses.

ii) O empregador deve custear as despesas do trabalhador tendo em conta o acréscimo dos custos de deslocação e da mudança de residência.

 

E, finalmente, vem referido que no caso de transferência definitiva, o trabalhador pode resolver o contrato se tiver prejuízo sério, tendo direito à compensação prevista no artigo 366.º.

Mas se é pacífica a questão sobre a transferência e os motivos que lhe dão causa e sobre a resolução do contrato por parte do trabalhador com invocação de justa causa, já esta não é assim tão linear uma vez que o argumento do prejuízo sério não está devidamente esclarecido na lei.

Na verdade, não se encontram tipificadas na lei situações que consubstanciem um prejuízo sério para o trabalhador, pelo que, a título exemplificativo, este pode decorrer de um aumento significativo do tempo de deslocação, da impossibilidade de auxiliar familiares doentes ou da dificuldade de acesso a determinados tratamentos hospitalares.

Torna-se, então, necessário refletir sobre a concretização do conceito de prejuízo sério.

Estão em causa: i) limitação do poder do empregador alterar, unilateralmente, o local do trabalho do trabalhador; ii) o direito à resolução do contrato e iii) a respetiva indeminização devida ao trabalhador.

Em primeiro lugar, devemos atender às circunstâncias de cada caso, devendo as mesmas assumir um peso significativo na vida do trabalhador, não podendo consistir num mero incómodo ou um simples transtorno suportável.

A jurisprudência, que se conhece, considera que, simples incómodos ou transtornos suportáveis que possam ser causados ao trabalhador, não devem ser considerados para efeitos de concretização do conceito de prejuízo sério. Mas determinar sobre estes conceitos é a questão que se levanta e não vai, naturalmente, ser resolvida aqui, já que os Tribunais têm decidido casuisticamente sobre esta matéria.

Num dos exemplos, um trabalhador considerou que aquela transferência lhe causou um prejuízo sério e para demonstrar o referido prejuízo, o trabalhador alegou que a distância que passou a percorrer na deslocação para o novo local de trabalho implicou um acréscimo de cerca de 100km a 150 km. Alegou, ainda, que a maior distância que teve de passar a percorrer lhe acarretou uma maior dificuldade em visitar o seu pai que padecia de doença crónica. Mas neste caso o Tribunal entendeu que os factos alegados pelo trabalhador não configuravam um prejuízo sério, mas apenas um simples transtorno.

Mas em sentido diverso, no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 5 de maio de 1993, entendeu-se que se se provar que a transferência determinou uma alteração substancial do plano da vida do trabalhador, traduzida na redução da possibilidade de poder prestar a mesma assistência aos dois filhos menores e na diminuição do tempo de convívio com os mesmos, está provada a existência de prejuízo sério.

O que, em conclusão, se não se provar pela existência de prejuízo sério, não pode haver lugar à resolução do contrato de trabalho com justa causa e por conseguinte, ao direito à indemnização a que o trabalhador teria direito ao abrigo do artigo 366º do Código do Trabalho.

Pertencerá sempre ao trabalhador provar que a transferência do seu local de trabalho para outro acarretará prejuízo sério na sua vida pessoal e familiar.

 

 

Agostinho Boalhosa de Freitas

Consultor/Formador